Pergunte ao Pó
2ª CRÍTICA
Pergunte ao produtor
John Fante lançou em 1939 o livro “Pergunte ao pó”, clássico da literatura norte-americana. Robert Towne escreveu em 1974 o roteiro de “Chinatown”, obra-prima do cinema. Por 30 anos, Towne nutriu o desejo levar às telas a obra de Fante. No ano passado, ele finalmente conseguiu. A partir desta sexta-feira, o resultado poderá ser visto no Brasil. Mas o que prometia ser um casamento perfeito entre literatura e cinema revela-se uma verdadeira lição sobre como não fazer uma adaptação.
“Pergunte ao pó”, o livro, narra as desventuras de Arturo Bandini, jovem ítalo-americano que se muda para Los Angeles na década de 30 com o sonho de se tornar um escritor. Ele luta contra a fome, o preconceito e a falta de inspiração. Nesse meio tempo, apaixona-se pela garçonete mexicana Camila Lopez.
Na sua primeira metade, “Pergunte ao pó”, o filme, reproduz todos esses elementos com fidelidade, mas sem inspiração. A escalação de Colin Farrell como Bandini e de Salma Hayek no papel de Camila – dois intérpretes com muito mais beleza do que talento – não melhora o panorama. Mas é na segunda metade do filme que Towne erra a mão feio. Ele reduz a história de Fante a um romance inter-racial entre um italiano e uma mexicana - algo que só pode ser visto como uma convenção hollywoodiana para agradar o grande público.
No livro de Fante, o amor de Bandini e Camila tem duas funções primordiais: destacar a necessidade da vivência pessoal para a criação literária (Bandini achava que não podia escrever sobre paixão se não vivesse uma) e sublinhar o sentimento de exclusão do personagem (que só aumenta quando ele se associa a outro ainda mais marginalizado). No filme de Towne, o caso dos dois serve apenas para derramar sobre o espectador os clichês mais baratos do melodrama.
Por meio de Bandini, seu alter ego, Fante defende a idéia romântica de que o escritor deve às vezes fazer sacrifícios para encontrar uma voz própria. Com sua adaptação, Towne propõe uma revisão cínica desse conceito, em que o artista admite fazer concessões para alcançar seus objetivos. O livro é uma elegia à independência. O filme, uma prestação de contas ao produtor.
Critica de Ricardo Calil no "OLHA SÓ"
http://olhaso.nominimo.com.br/index.php?s=pergunte+ao+p%F3
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Pergunte ao Pó
3ª CRÍTICA
Toda vez que estréia um filme adaptado de uma obra literária uma pergunta aparece: "o filme é fiel ao livro?" E mais: "o que é melhor, livro ou filme?". Existe uma resposta padrão para a questão: "são coisas totalmente diferentes, linguagens diferentes. Portanto, cobrar fidelidade ou comparar qual é melhor seria inadequado". Tudo bem. Concordo em tese. Pois existem filmes que acabam se aproveitando do sucesso e da qualidade de certos livros para alçar vôos que sozinhos não fariam, fugindo de tal forma do livro que chegam a parecer oportunistas, tamanha a disparidade com a obra base.
Pergunte ao Pó (Ask the dust, 2006), dirigido por Robert Towne e que adapta o livro homônimo de John Fante, vai nessa linha - apesar de Towne ter sido amigo de Fante e de ter tido o consentimento da família para fazer a adaptação e mudar o final da história. Fante, que também foi roteirista, se estivesse vivo, talvez entenderia as mudanças e talvez até as aprovasse, como fez a sua família, mas os leitores de Fante, com certeza, não aprovam e devem torcer o nariz, com toda razão, para o filme.
Voltamos então à questão: o que é melhor, livro ou filme? Digo que apesar das linguagens serem diferentes, Towne, por mais próximo que tenha sido de Fante, não consegue transformar a riquíssima prosa do escritor em imagens interessantes e nem mesmo dá à trama de Arturo Bandini e Camila Lopes o tom adequado. Sua visão trai a matéria do livro, o transforma num melodrama banal, açucarado e distante da rigorosa, densa, triste e incrivelmente fluida poesia do livro.
Até a metade, o filme até que se sustenta. Colin Farrell constrói de forma aceitável seu Arturo Bandini, um alter-ego de Fante, escritor iniciante que se alimenta de frutas passadas, quase estragadas, para sobreviver na cáustica Bunker Hill, Los Angeles, nos anos 30. Neste cenário, ele acaba conhecendo num café a garçonete mexicana Camila Lopes, Salma Hayek, com quem mantém uma relação de amor e ódio. O filme, num primeiro momento, até tem êxito em retratar essa relação que explora as relações inter-raciais da América da época: um ítalo-americano e uma mexicana, ambos tentando vencer na América; mas, não consegue chegar perto da dimensão humana, demasiadamente humana, com a qual Fante constrói esses dois seres belíssimos, trágicos, retratados minuciosamente em suas fraquezas.
O filme, além de não primar por construir belas imagens - o livro está cheio delas -, acaba desconstruindo a história, modificando alguns pontos chaves da relação, principalmente na sua parte final. Não explora o fato de Camila ser apaixonada de forma doentia por outro, Sammy, um escritor sem nenhum talento que a destrata, e ainda omite uma parte importante da história, na qual ela, em total decadência, apodrece em casa devido ao vício de maconha.
A impossibilidade do amor entre Camilla e Bandini é o que torna o livro maravilhoso. O filme inverte isso e ainda transforma o vício de Camilla numa melodramática tuberculose. Essa opção altera completamente a belíssima passagem final do livro, que lembra Paris, Texas (1984) e a busca de Travis, personagem principal do filme de Wim Wenders, pelo deserto. O romance deixa em aberto a história e usa com maestria a imagem do deserto no qual a infinidade de caminhos pode representar também que não há caminho algum.
Para terminar, indico veementemente a leitura do livro, uma obra-prima incontestável. Bukowski, para se ter uma idéia, admirava tanto o escritor que exigiu que seu editor relançasse a obra de Fante como condição para que ele, Bukowski, continuasse editando os seus livros pela Black Sparrow.
"Não havia estradas, nem cidades, nenhuma vida humana entre aqui e outro lado do deserto, nada a não ser a terra desolada ao longo de quase cento e cinqüenta quilômetros. Levantei-me e continuei a caminhar. Estava dormente do frio, mas o suor escorria pelo meu corpo. O leste acinzentado iluminou-se, metamorfoseou-se em rosa e depois em vermelho, e então a gigantesca bola de fogo ergue-se das colinas enegrecidas. Através da desolação, havia uma suprema indiferença, a casualidade da noite e de outro dia e, no entanto, a intimidade secreta dessas colinas, sua maravilha silenciosa e consoladora faziam da morte uma coisa sem grande importância. Você podia morrer, mas o deserto esconderia o segredo da sua morte, ela persistiria depois de você, para cobrir sua memória com o eterno vento, calor e frio. Não adiantava. Como eu podia procurá-la? Por que deveria procurá-la? O que poderia trazer-lhe a não ser um retorno à selvageria brutal que a havia derrotado?".
Uma obra única, o livro, é claro.
Cesar Zamberlan do Site Omelete
http://www.omelete.com.br/cinema/artigos/base_para_artigos.asp?artigo=3178
Outras críticas e informações:
http://www.cranik.com/critica_pergunteaopo.html
www.cinemacafri.com/filme.jsp?id=550
http://www.revistaparadoxo.com/materia.php?ido=3379
www.kinemail.com.br
Site Oficial: http://askthedustthemovie.com
18 de junho de 2008
Pergunte ao Pó
às 16:37:00
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